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Adolescência até os 24 anos?

Pesquisadores australianos sugerem que a adolescência vai além dos 19 anos: implicações biológicas, sociais e culturais de um conceito em transformação

A adolescência é tradicionalmente entendida como o período de transição entre a infância e a vida adulta, marcada por intensas mudanças físicas, emocionais e sociais. Por décadas, a Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu essa fase entre os 10 e 19 anos. Contudo, pesquisadores australianos trouxeram à tona uma proposta que vem ganhando repercussão mundial: ampliar a adolescência até os 24 anos.

A justificativa para essa redefinição vai além de uma simples mudança terminológica. Trata-se de uma atualização baseada em fatores biológicos, como a plena maturação cerebral que só se completa por volta dos 25 anos, e sociais, já que os jovens estudam por mais tempo, adiam casamento, independência financeira e a chegada dos filhos.

No Brasil, a discussão ganha contornos próprios, sobretudo diante do fenômeno da chamada “geração canguru”, termo usado para descrever jovens adultos que continuam vivendo na casa dos pais mesmo após os 20 anos, muitas vezes por razões econômicas, mas também culturais.

Este artigo busca explorar em profundidade o tema, analisando as razões biológicas que sustentam a proposta, os reflexos sociais dessa redefinição, os impactos legais e econômicos que ela pode trazer, além de comparar como diferentes culturas encaram a transição da adolescência para a vida adulta.

Adolescência agora vai até os 24 anos de idade, e não só até os 19, defendem cientistas

A adolescência como construção histórica e social

Com quantos anos começa a adolescência?

O conceito tradicional

A adolescência, como entendemos hoje, é um conceito relativamente moderno. Durante séculos, muitas sociedades não reconheciam uma fase intermediária entre infância e vida adulta. O indivíduo passava diretamente da condição de criança para a de adulto, geralmente por meio de ritos de passagem.

Foi apenas no século XX, com o desenvolvimento da psicologia e da sociologia, que a adolescência passou a ser vista como uma etapa distinta, caracterizada por transformações físicas da puberdade e pela busca de identidade.

O papel das transformações sociais

Mudanças sociais, como a expansão da escolaridade obrigatória, o surgimento da juventude como categoria cultural (particularmente após a Segunda Guerra Mundial) e o prolongamento da dependência econômica, ajudaram a consolidar a adolescência como um período estendido. Hoje, muitos pesquisadores defendem que a juventude é cada vez mais fluida, dificultando delimitações rígidas.

A proposta australiana: adolescência até os 24 anos

O estudo

Pesquisadores australianos argumentaram que os 19 anos não representam mais o limite real da adolescência, uma vez que o corpo e o cérebro continuam em transformação até meados da década dos 20. Essa sugestão não se restringe a um exercício acadêmico, mas abre espaço para discussões sobre políticas públicas e expectativas sociais.

Justificativas biológicas

  1. Puberdade precoce: hoje, meninas menstruam em média entre 12 e 13 anos, antecipando o início da adolescência.

  2. Maturação cerebral: estudos de neurociência apontam que o cérebro humano só atinge plena maturidade — especialmente o córtex pré-frontal, responsável por decisões racionais e controle de impulsos — entre os 23 e 25 anos.

  3. Marcos físicos: sinais de conclusão do desenvolvimento, como o surgimento dos dentes do siso, também acontecem apenas após os 20 anos.

Justificativas sociais

  • Educação prolongada: jovens passam mais tempo estudando, muitas vezes até os 25 anos ou mais.

  • Casamento e filhos tardios: a média global para o primeiro casamento e para a parentalidade aumentou significativamente.

  • Dependência econômica: cada vez mais jovens adultos permanecem na casa dos pais, seja por dificuldades financeiras ou por opção.

Impactos legais e sociais da redefinição

Repercussão em políticas públicas

Se a adolescência fosse estendida até os 24 anos, seria necessário repensar leis e políticas voltadas para a juventude. Benefícios sociais, programas de saúde e estratégias educacionais teriam que se ajustar a essa faixa etária mais ampla.

O dilema da “semidependência”

A proposta evidencia uma fase de “semidependência”, em que o jovem não é mais criança, mas também não é plenamente autônomo. Isso levanta questões sobre responsabilidades legais, acesso a direitos e até mesmo sobre como a sociedade deve enxergar esse grupo etário.

Críticas: infantilização prolongada

Alguns críticos veem a ideia como um risco de prolongar a infantilização dos jovens, atrasando a assunção de responsabilidades e reforçando a ideia de que a vida adulta pode ser eternamente adiada.

A “geração canguru” no Brasil

Jornal da Franca - Atenção, pais: Adolescência agora vai até os 24 anos e não só até os 19! - Jornal da Franca

O fenômeno

No Brasil, muitos jovens permanecem na casa dos pais até depois dos 24 anos. Segundo pesquisas, fatores como dificuldades no mercado de trabalho, custos elevados de moradia e mudanças culturais contribuem para esse fenômeno.

Aspectos culturais

Em sociedades latinas, como a brasileira, a convivência prolongada com a família é muitas vezes normalizada. Diferente de países anglo-saxões, onde sair de casa cedo é valorizado, no Brasil há maior aceitação de permanecer sob o mesmo teto, mesmo após a entrada na vida adulta.

Comparações internacionais

Europa e América do Norte

Em países europeus e nos Estados Unidos, o marco da vida adulta ainda é associado à saída de casa, conquista da independência financeira e formação de novas famílias. Contudo, mesmo nessas sociedades, pesquisas mostram que os jovens estão demorando mais para atingir esses objetivos.

Culturas tradicionais

Em outras partes do mundo, a transição para a vida adulta continua sendo marcada por ritos de passagem — como cerimônias religiosas, militares ou culturais —, que delimitam simbolicamente o fim da adolescência, mesmo que biologicamente o indivíduo ainda esteja em desenvolvimento.

Biologia e psicologia do prolongamento da adolescência

Desenvolvimento cerebral

A maturidade do córtex pré-frontal é um dos principais argumentos para estender a adolescência até os 24 anos. Essa região está ligada ao pensamento abstrato, ao planejamento de longo prazo e ao controle das emoções.

Saúde mental

Jovens entre 20 e 24 anos ainda apresentam altos índices de transtornos mentais, como ansiedade e depressão. Reconhecer essa faixa etária como parte da adolescência poderia favorecer políticas públicas de saúde voltadas para esse público.

Identidade e pertencimento

A psicologia do desenvolvimento mostra que a formação da identidade se prolonga para além dos 19 anos. Questões como escolha profissional, identidade de gênero, posicionamento político e projeto de vida são muitas vezes definidos apenas na faixa dos 20.

Críticas e contrapontos

A vida adulta em risco de desaparecimento?

Um dos principais receios é que ampliar a adolescência dilua a noção de vida adulta. Se alguém só é considerado adulto aos 25 anos, como ficam responsabilidades legais, casamento e mercado de trabalho?

Diferenças de contexto

Críticos também lembram que a experiência da juventude varia imensamente conforme o país, classe social e cultura. Para jovens de classes populares, que entram cedo no mercado de trabalho, a adolescência estendida pode parecer um conceito distante.

Implicações práticas

  1. Educação: políticas educacionais poderiam se estender até os 24 anos, com foco em apoio psicossocial e inserção profissional.

  2. Saúde: planos de saúde e programas públicos precisariam adaptar atendimento para jovens em fase de desenvolvimento até os 24 anos.

  3. Direitos legais: leis sobre maioridade penal, trabalho e responsabilidade civil poderiam ser impactadas, gerando debates intensos.

Conclusão

A proposta de estender a adolescência até os 24 anos não é apenas uma questão de nomenclatura. Ela reflete transformações profundas na sociedade contemporânea, tanto no campo biológico quanto no social.

De um lado, a ciência aponta que o corpo e o cérebro continuam em desenvolvimento até meados da terceira década de vida. De outro, fatores econômicos e culturais mostram que os jovens demoram mais para se tornar independentes.

O desafio, portanto, é encontrar um equilíbrio: reconhecer a complexidade dessa fase sem reforçar a infantilização, garantindo apoio para que os jovens possam se desenvolver plenamente e conquistar autonomia.

Mais do que redefinir a adolescência, a questão nos leva a refletir sobre como nossas sociedades entendem o processo de amadurecimento e de que forma podem apoiar os indivíduos nessa longa transição entre infância e vida adulta.

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